Michigan, uma carta de despedida.

O nosso lar de Michigan que ficara para sempre em nossos coracoes.

Você me deu boas vindas no inverno de 2013 com a sua neve branquinha e o seu vento gelado. Quantas espectativas, planos e sonhos tinham dentro daquelas seis malas.

Aquele primeiro inverno foi um marco na minha vida e até hoje eu me lembro dos pequenos detalhes daqueles primeiros meses.

Houve recodes de frio e de neve acumulada naquele ano, junto com a loucura em encontrar uma casa para morar, matricular filho na escola, tirar novos documentos e descobrir que o meu inglês era ruim pra caramba!

Estavamos realizando um sonho e muito felizes!

Naqueles primeiros meses de inverno me senti morando dentro de um filme de Natal, tudo era novidade, até os inúmeros perrengues comuns aos recém chegados.

Pessoas especiais entraram em nossas vidas durante esta longa jornada, nos mostrando os caminhos mais suaves e nos abrindo suas portas literalmente. Algumas tiveram que partir, outras chegaram algum tempo depois.

Você nos ensinou que chegadas e despedidas fazem parte deste processo de se aventurar por outras terras.

Quantos lugares lindos e experiências bacanas tivemos por aqui. Posso dizer que te desbravamos de norte a sul e de leste a oeste.

Os seus parques verdinhos, as suas cidadezinhas saidas de filmes da sessão da tarde, as suas dunas de areia, as suas praias e os seus infinitos lagos. Vimos Detroit renascer!

Mas os seus invernos sao apenas para os fortes.

É claro que todos os anos você tentava compensar o frio e a escuridão do inverno com o clima natalino de Dezembro e as suas luzinhas de Natal cintilantes espalhadas pelas ruas acompanhadas das músicas natalinas a la Mariah Carry no rádio (🎵”its’s tiiiiiimeeee”🎵).

Também tinham aqueles dias de inverno onde o seu céu ficava com uma cor de azul inexplicável de tão azul, sem nehuma nuvenzinha.

E também tinham aquelas manhãs de sol geladas após uma noite de muita neve onde cada galho de árvore parecia uma escultura feita de neve e pequenos cristais onde até o silêncio ficava mais silencioso.

E a neve fresquinha no chão que brilhava como purpurina com os raios de sol da manhã.

Aprendi que exitem vários tipos de neve e não é com qualquer uma que se faz um digno boneco de neve ou uma uma bola de neve decente. E também conheci um novo som e sensação nos pés que só acontece quando você caminha em uma calçada repleta de neve.

Você as vezes tentava dar uma enganada mandando um dia de primavera em pleno mês de Janeiro, mas acabava perdendo a mão lá pelo mês de Abril quando mandava aquela neve de saideira.

Foram onze longos invernos.

Teve desafios mas também teve muita coisa boa.

Você me proporcinou viver uma cultura diferente e aprender muito com ela, me ofereceu segurança, liberdade e resiliência. Pessoas queridas se tornaram a nossa “Michigan Family”, o que acalentava nossos corações por aqui.

Você se tornou sinônimo de lar para o meu filho mais velho e foi aqui também que a nossa família cresceu e um Michigander original de fábrica chegou para completá-la e multiplicar o amor.

As sua primaveras chegavam acompanhadas de chuva e aquele cheiro de terra molhada que junto com as flores branquinhas da Dogwood tree e dos dandelions amarelos os quais forravam os gramados, nos traziam a sensação de renascimento após o seu longo inverno.

Os seus verões guardarão para a sempre as mais lindas recordações da minha passagem por aqui. Nossas viagens em família, as noites com aquele bafinho quente na saida do cinema, os sorvetes de final de tarde, as elephant ears de cinnamon açucaradas das festinhas das cidades, os picniques de café da manhã nos parques, a pescaria no laguinho no fundo de casa, nossos passeios de bicicletas, o pula pula com direito a banho de mangueira para se refrescar, os bate papos com os amigos no quintal.

E ainda tinha os nossos campings de verão. Os perrengues mais gostosos que tivemos.

Era calor na barraca, era chuva e frio. Criançada brincando desde de hora que acordava até a hora de dormir com aquele cheiro de lenha nos cabelos. Churrasquinho, noite do hamburguer, aquele macarrão salvador da fome, s’mores em volta da fogueira e até festa junina tinha! Era patinete, bicicleta, pescaria, passeio de barco, caique e muita praia de lago com água cristalina.

Era querer fazer caber um ano inteiro dentro de 3 meses.

Michigan, obrigada pelo os seus verões.

Quando Setembro chegava, eu já começava a sentir um certo desespero pois eu sabia o que estava por vir. O amor que eu sentia por você durante o verão começava a ir embora.

Mas você, usando mais uma de suas táticas, começava a tingir a paisagem de amarelo, laranja e vermelho e ainda adicionava cheiro de abóbora, maçã e canela!

Michigan no outono era golpe baixo. Como não se apaixonar por você durante o outono?

Não tinha como olhar pela janela ou sair de casa sem agradecer por morar em um lugar onde existe outono.

Uma simples caminhada pelo bairro era motivo para querer tirar uma foto, por mais que eu ja tivesse mil fotos da mesma árvore depois de tantos outonos por aqui. Mas o outono de Michigan nunca cai rotina, não enjoa, o único problema é que ele dura muito pouco e sempre deixa um gostinho de quero mais.

Mas chegam momentos da vida em que decisões precisam ser tomadas e é necessário ajustar as rotas da vida.

Sei que te deixei no seu melhor momento, em pleno verão! Que ousadia a minha!

Parece até que você estava pressentindo, pois pela primeira vez depois de todos estes anos você me proporcinou ver uma aurora boreal do meu quintal!

Também não sei se foi de propósito, mas nunca as árvores do meu quintal estiveram tão bonitas e grandes e até as cranes que sempre me observavam a distância estavam todas amigáveis vindo até a porta da minha varanda.

Também achei que seria mais fácil, mas não foi.

Nos últimos momentos juntos o meu coração ficou apertadinho. Será que esta era a decisão correta?

A nossa casa que nos acolheu por todos estes anos e que testemunhou tantos momentos da história da nossa família e da infância dos meus filhos iria ficar para trás, assim como o quintal mais lindo que eu poderia ter.

No dia de partir, como foi doido olhar para cada cômodo vazio e fechar porta do nosso lar pela última vez.

Como foi difícil dar o último abraço naqueles que nos acolheram e que fizeram parte da nossa vida e história por estes quase 11 anos.

Obrigada Michigan por ter sido a nossa morada. Saiba que o nosso coração brasileiro sempre será um pouquinho Michigander.

E assim, em uma manhã de domingo de verão, eu parti.

Com carinho, Juliana

(Julho/2024)

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Um comentário sobre “Michigan, uma carta de despedida.

  1. Parabéns pelo lindo texto como sempre! Foi ótimo compartilhar todos estes anos com vc e as crianças em Michigan. Mas tomamos a decisão que achamos a melhor para nossa família neste momento dentro da possibilidade de nosso trabalho. Então vamos juntos a uma nova aventura.

    Léo B.

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